Bom dia rapaziads!!! Está chegando o nosso CD, e pra vocês já terem u…

Bom dia rapaziads!!!
Está chegando o nosso CD, e pra vocês já terem uma ideia do que vem, segue o poema que Danilo Costa Gusmão fez para o nosso CD…

Train to Skavilla

um caboclo
de mérito pouco
cansado do
oco pigmento
em seu toco-terreno
sertão

– onde sempre o pé
foi raiz
e nunca viu outro
caminho de chão –

inaugura o movimento
rumo a terra de todas as cores
e vida melhor: cidade-cimento

na plataforma,
de tão sem costume,
em busca do trem babilônico,
tropeça no encanto de
máquina locomotiva
com outro destino
prestes a partida
escrita que varia no letreiro:
train to skavilla

bilhete na mão
pé no vagão
trilho no mundo

o organismo de ferro
liga seu rumo
e o balanço acelera
o que passa pela janela
e no peito do cabra

é árvore, boi
horizonte ao redor
o motor que engatinhava
agora ganha costume
de movimento
o que era partida
– pé no chão-raiz –
toma forma de caminho
onde o novo
irradia: travessia

nessa hora,
tendo pouca compreensão
de sentimento
o homem se ajeita
no assento
incomodado

a memória lance-lhe à mente
o rio da infância e de toda vida:
passava rente
ao pouco terreno
aonde cabia a
cabana de alicerce-remendo
a brincadeira na beira
o corre-corre dos meninos
a mãe chamando pra dentro
o profundo saber
de tão pouca visão
o tamanho de nada do olho
perto do dentro imenso do peito
entendimento em coração
terra natal

de susto:
– eita! é saudade
abate a cara do cabra
que já não vê quase nada
no em torno do trilho estrada

– aceita uma bebida, senhor?
– aceita.

um gole de mágoa
faz companhia
ao caboclo
mais um, outro
multidão engarrafada
primeira parada:
skabulosa.

borboletas atômicas
instantâneo cosmos
clarividência ilógica

por todos os lados
o lado vira porta
sólido se entorta

a vista pisca e
tira da frente a visão
o corpo testa
a asa em meio a
festa de sons e
luz neon

hélices, hálitos, música
máscaras, máximo, mínimo,
micropontos cintilantes, sinergia
decolagem, viagem,
bacante sincronia de todo
sintoma e sentido.

silêncio.

o trem volta a seu
rumo de estrada e
o cabra dentro

– que foi que foi isso?
fronteira solúvel em cérebro.
a paisagem volta ao movimento
a saudade faz companhia
na cabine cantilena

lá na frente a fumaça
alça voo
o apito arrisca notas de sertão
o repetido movimento
do atrito do vagão.
tudo se soma ao modo
de zabumba
sanfona e cantador
locomotiva-baião

o vagão embala
no ritmo, no trilho
de gonzaga
colhendo no seco do chão
seu movimento-flor.
vaga em curva limiar
ao verso-trajeto

e é de novo
a lembrança que visita
na cabeça do caboclo
aquela mesma esperança
de chuva retorna
e faz lágrima-nota
rosto trilho rota
ístimo da gota
e seu ritmo de queda
íntimo choro atípico

a água pouca
dotada de propriedade toda
penetra na pele
da boca
e percorre o caboclo
com seus
diamantes lúcidos de céu

planta-se semente
de ideia
que planta-se em futuro
que planta-se crescente em planta
que se planta em tronco fixo
que se planta em ramo
que implanta espelho secreto subterrâneo: raiz
que plange no topo
que se planta em graveto e folha
que planeja flor
que, em seu plano repleto de canto,
implementa, planta projeto de ideia fixa
de fluxo cíclico:
semente(-)se planta

num neocordel
o caboclo se enraíza no ar
feito pétala-pássaro céu
criamentos de chão e nuvem
se dão em suas juntas
ele se senta no imaginário
a ponto de mito
muito saudoso do tempo e da terra
e tomado por esse sentimento
torna-se ela

engendra-se o quem no onde
lenda de terra tão longe
habita e propensa o ser
do caboclo
instituem-se elos aéreos
lisérgicos
entre o homem e seu chão

o trem que carrega esse ente-conexão
aplica em si o mesmo processo
toma contorno de lenda
se solta do trilho
encosta no solo a barriga papuda
de homem-alimento
concreta coluna de rio

se arrasta no chão rumando vento
o rastro incendeia e
se dá pelo ar
todas as matas saúdam
o expresso-boitatá

caboclo sertão e trem-cobra-brasa
numa comunhão de
lenda, palavra e som
um acordo entre
homem bicho terra e máquina

atingem sua última estação
derradeira parada
algo planeta, algo jamaica
algo com nada parecido
esquecido de todo

a fumaça revela um
asilo de translucidez
aquilo que nunca se fez
a milhas e milhas do que
a concretude oscila ao mostrar
lugar sem posicionamento, sem pouso
ilha sem volta de mar
skavilla